segunda-feira, dezembro 24, 2007

Pequena história de uma crise de cognição










Minha avó
Que é uma famosa
Diretora de curtas-cabeça
Me dizia
Desde bem pequeno
Que o homem
É uma maquininha de fazer sentido

Disse que ele faz isso
Desde muito antes de Cristo,
Pelo qual alguns martelam sua dor,
Até a Guerra no Iraque
Que para alguns é justa
E para outros, santa

Por tudo isso ela diz
que até esse cigarrinho
Que ela me pegou aqui fumando escondido
Em plena altura dos meus doze anos
No enterro do meu pai
Tem sua certa explicação

Foi quando eu protestei
Ora, vó, veja bem
Que foi muito foda
Ver meu pai atropelado
Por um assaltante
No seu próprio carro

E ela me disse rindo
Que sentido só não teria
Se em vez de cigarro fosse um charuto
E eu fiquei muito puto
Porque pode tudo ter sentido?
Eu reluto
Eu me recuso
Em dar sentido ao absurdo

domingo, dezembro 23, 2007

Um homem só com guarda-chuvas











*Imagem retirada do site oficial do exército dos Estados Unidos



Quando chovem guarda-chuvas o que nasce, não árvores
mas homens e homens e homens todos o mesmo homem
vestido de casaca e sobretudo sobretudo, sobre todos
entre céus reflexos e firmamentos
chuvas de guarda-chuva lhe secando por dentro

quinta-feira, novembro 08, 2007

Câmera escura










Estou olhando agora por uma câmera escura. Tenho procurado me delimitar. Aos poucos. Faço cada dia menos coisas. Negação? Sim, digo a quase tudo um sonoro não. Porque meu sim sempre foi fingimento, e não para ninguém, mas para mim mesmo. Melhor estou enquadrado, jogando na sombra tudo que eu não dou conta. Não deixa de existir. Mas eu existo.

domingo, outubro 14, 2007

Domingo de repordução em massa.




Faustão é um dado do tempo. Faustão é o domingo.

Ah, esse gosto exagerado de doce na boca. O cara barrigudo deitado no sofá. A tal da patroa. Barriga cheia e fome. Sorvete depois do almoço. Piada gasta. Doçura mórbida. Há algo de enterrro em tudo isso. Há um morto faltando. Não sei o que faria sem você. De alguma maneira, acho que gosto de ti. Não sei o que seria do domingo. Porque é assim que a semana termina. Não com um sábado, mas com um domingo.

E a segunda começa depois do fantástico.

domingo, setembro 30, 2007

Por um fio

Você está suspensa em pequeninhos fios de nylon
És como uma marionete quebrada:
Eles só te mantêm erguida, querida,

pra que você continue pendurada.

Corte os fios. Não arranque os cabelos.
Não use mais Vicodin.

Descobri que gosto mais de ti quando me decepcionastes.
Não que tenhas feito nada de errado. Mas por ter te descoberto. Nua, sem decote.
Por um tempo, fingi que esqueci. Agora, com desejo seco, te observo, impassível, cruelmente, esperando que te reergas. Quando vais voltar a ser aquilo que eu sempre quis que fosses e não eras?

Chega de abismo, querida. Eu quero a tua vertigem.

sábado, agosto 18, 2007

As jujubas ambulantes








Dois meninos negros em um ônibus. Ambos possuem, aparentemente, a mesma idade: digamos, uhm, cinco anos. Um está sentado, perninhas balançando no assento: sua mãe está na fileira de cadeiras ao lado. O outro está de pé e percorre o corredor vendendo jujubas. O de pernas empinduradas lhe olha, avidamente, olhos arregalados e boca entre-aberta. O menino, sem nenhuma expressão, faz seu trabalho. Na volta, passando por nós, ele recolhe os pequenos pacotes e o que está sentado se inquieta no assento, se erguendo para lhe ver partir, docemente estupefato.
Sua mãe não lhe quis, afinal, comprar o doce?

domingo, julho 22, 2007

O vidro e a paisagem

sol tropical
o ar-condicionado no máximo
dando aquele clima diferenciado
mendigos na calçada
coreografia dos gestos displicentes
cenografia de novela da globo
lugar em que a gente se sente

fora da cidade

avenida de prédios baixos
vitrines de dois andares
o céu estalando de azul
o clima intimista da iluminação pontual
o negro ameaçador guardando o carro

a transparência dura
enquadra e funda a paisagem

quinta-feira, julho 05, 2007

chuvas de Junho

Meu rosto apara
os pingos de chuva
que apagam o sol de meio dia

A calçada
pela primeira vez é fresca
e os pés se apressam,
culpados,
sob o doce prazer
de estar ficando gripado

Eu gosto mais de maio

Poema em Junho:

Hoje a saudade bateu
PÁ, PÁ, PÁ!
Deu dois tiros e sumiu

(Seu cheiro passou
enquanto eu esperava
na parada)

domingo, maio 27, 2007

nimbus de maio

Para variar um pouco, uma quadrinha estranha e nebulosa:

o sono cinza sobre o azul
tinge as paredes do teu quarto
de uma luz pálida entrecortada
uma janela para o nada

quinta-feira, maio 17, 2007

alguma coisa se alterou

alguma coisa parou
e eu deveria saber o quê
mas não sei

alguma coisa alterou seu ritmo de batida
e não foi meu peito
nem meu pé debaixo da mesa no meu tic nervoso

alguma coisa se mexeu e não foi ladrão
nem mosca, nem a gata dentro da cozinha
alguma coisa se repete e não foi essa reiteração

de alguma coisa vivo eu
e se se altera
é como estar andando numa esteira elétrica
que de repente para
ou aumenta de velocidade
e eu tropeço, assim,
do nada

alguma coisa se alterou
e eu penso que pode ter sido tanta coisa
que alteração de verdade seria se ficasse tudo igual

alguma coisa se alterou e não foi uma súbita necessidade de explicação
nem coceira no pé, nem nada

alguma coisa parou de se alterar
e se eu não descobrir já
em breve jamais saberei

domingo, abril 29, 2007

Não tem título

Sabe como ama um gato
um amor que não é fácil
e s'indolor

um amor não automático
um amor que indiferente
convivência sutilmente
todo o dia
e vela (`)a noite

meu deus como é bonito
que brilho é esse
de sol dentro da noite
quando tu me olha assim
tão penetrante indiferente

notar
depois de um dia inteiro
o gato
imóvel em cima da cama
ao lado do jarro das flores do armário

como pode amar assim um gato

Elegia

quarta-feira, abril 25, 2007

o pó ainda paira

da explosão de vidro da janela de um carro sem insufilme
nasceu esse mundo
pulverizado
informe
rasgante
e rasgado

brilhando
em parte
em cima da pista
Pó de vidro na poeira do asfalto.

meus olhos
ardem
me dói
a dor de cabeça
e eu nem sei
e eu nem vejo
mas,

O pó ainda paira.

domingo, abril 08, 2007

Os gatos aéreos de minha mãe

Para Yeti Braga
Por cima das telhas, olhos brilham no escuro. Os gatos aéreos pesam menos de um quilo e nunca tocaram o chão.

Minha mãe os alimenta à noite, sorrateira, para que minha vizinha histérica, que fica de vigília no apartamento de baixo, não veja. A luz da varanda acesa.

Os gatos se alimentam de camarões translúcidos os quais minha mãe lhes joga da altura de nosso segundo andar. Moro sozinho com ela aqui nessa cidade sozinha, num lugar qualquer entre prédios e casas. Minha gata Yeti desapareceu há três anos e foi achada morta pelo mesmo zelador que a matou, em um terreno baldio perto daqui. Sei que a vizinha do lado, amiga da histérica, foi quem encomendou sua morte. A velhinha não suportara o fato de ter como única visitante a gata esbelta e branca, mais branca do que a cor branca de seus cabelos. Yeti deslizava da minha varanda para a dela e completava o retrato de uma vida insuportavelmente solitária. O sofá azul, a tv ligada, o marido, eternamente dormindo na poltrona da sala e a sombra da gata, a sombra mais alva que a luz da tv.

As duas vizinhas jamais se viram, mas se reconheciam cúmplices nos gritos que ouviam durante o dia, as pragas se alternando entre os gatos da rua, as crianças do prédio e qualquer sinal de vida que viesse de fora. Foi depois da morte de Yeti que os gatos aéreos surgiram, toda noite prostrados em direção à nosso prédio, reunidos em um bando de seis. Como que em vingança, encaravam a velha no escuro quando levantava de madrugada para ir tomar água na cozinha. Os doze olhos vermelhos fixos na escuridão contra ela, a velha se apavorava.

A mim também sempre olhavam, não em vigia, mas como que na espera, e eu não podia fazer nada além de tentar desesperadamente adivinhar o que queriam. Não importa que horas da noite olhasse da minha janela, sempre encontrava os seis ou cinco gatos me encarando no escuro, como prestes a pular para dentro do meu apartamento .

E apesar da altura e distância, isso nada me parecia impossível, já que dado a alimentação peculiar que recebiam, era enormes, grandes e fortes e mais que tudo, leves feito aves. Não me surpreenderiam se fossem feitos de oco, como as cascas inteiras de camarão que minha mãe lhes jogava, todos os dias, depois de nos fazer o jantar com a carne que extraia. Só não teria certeza de que fosse assim porque aqueles olhos de lanterna vermelha pressupunham vir de um fundo tão fundo que era tudo menos vazio.

Eu rezava todas as noites pela vizinha tola, já que sabia que tanto Deus como o Diabo possuíam gatos e que em nenhum dos lugares teria misericórdia. A histérica reclamava das moscas, que comeriam o côcô dos animais, e a velha já esquecera a muito tempo de dar pretextos, ameaçando jogar carne envenenada para os gatos. A histérica passava as noites em vigília e ao ver os corpos ocos de camarão sendo jogados do andar de cima, espumava de raiva e juntava a energia que despejaria no dia seguinte amaldiçoando os gatos em voz alta.

Mamãe não as temia, mas crescia seu amor pelos gatos. Eles pareciam entender e aumentavam seu empenho, esperando em fila em cima do muro quando ela se atrasava. Não seria preciso dizer que nessas ocasiões apavoravam ainda mais a velha, mas a histérica jamais se apercebera porque nunca olhava pela janela.

Isso tudo até certo dia em que a velha não praguejou e a histérica, preocupada, foi finalmente ao seu apartamento conhecer a velha amiga. Encontrou marido e mulher mortos estatelados no chão, o boletim de polícia dizendo que morreram envenenados. Os gatos das telhas desapareceram, assim como o zelador, que pós fim ao inquérito assinando com a fuga o certificado de culpa, e nunca mais foi encontrado.

segunda-feira, abril 02, 2007

a queda da panela

A luz da tv ilumina o quarto na madrugada

o som é baixo
mas abafa o murmúrio da rua
que incomoda

vozes desconhecidas e deslocalizadas
o assobio insistente que começa difuso e ronda o quarteirão
barulhos esparsos e ritmados como que de passos na escada

o som da tv
o murmúrio por hora o abafa
uma pancada de metal ressoa alto e em seguida o silêncio absoluto
nem sequer os passos

agora só a respiração da cama ao lado
e aos poucos o barulho seco de uma gota alta
barulho esparso e ritmados
É o tempo nessa madrugada.

sexta-feira, março 30, 2007

paisagens (de aqui)

um pardal voa
e pousa
sobre os galhos secos
de uma planta seca

um indivíduo negro
no escuro
vira a esquina de uma vez
e o caminhante pula
pro outro lado da calçada
pensando ser um bote

o sibilo de cobra
do lagarto
na parede de pedra
palpita
no peito do passante

Branco tédio

Luz perpendicular amarela por venezianas na parede, às 16:30h

azulejos opacos revestem o hall
hall vazio, às 16:30h
tudo claro, até as formas
simples arestas aparadas
esterelizado histérico
lençol branco
tempo no tic tac do pingo do soro
nem analgésico, nem antibiótico,
ponto ou cicatriz
só soro

Minhas paredes são todas pintadas de branco gelo.

quinta-feira, março 22, 2007

caminho das pedras tortas

os pés sob o asfalto
a pressa o passo

atravesso a falta de espaço sob a sola do sapato

desequilíbrio no ralo
caminho das pedras tortas

a água escorre
rios entre as pedras esparsas
os pés entre suas margens
o equilíbrio bêbado e rápido

fuga do tempo
e dos carros

o teto da cidade

meio dia de chuva
nada mais urbano que a falta de asfalto
o subúrbio
suburbano
e calmo

sob céus de fios de cobre
o pingo da gota de chuva
escorrega
________na laje em decline
lambe a ponta da telha
e cai no áspero da calçada
encharca e

_________escorre
se levanta
e rola
____pelo vãos da calçada
se apossa dos seus buracos
e reflete o céu
com chãos de zinco

deixe estar

lembro do dia
em que meu olhar
cruzou com o teu
pelas costas
de calçadas opostas
e eu decidi, ali
te amar pra sempre
e só

terça-feira, março 20, 2007

céu de acrílico azul piscina


flutuando no cloro
o besouro morto ainda voa
luz ondulando ao meio dia

a água brilha mais que o asfalto

(Uma vez eu vi um mar tão bonito que parecia até uma piscina!)

um corpo perfura
a superfície azul e nuvem
que tremula

pele engelhada sobre azulejo trincado
o dedão do pé achatado risca o chão

um susto:

a pele não se corta

terça-feira, fevereiro 20, 2007

acontecimentos

eu espero
um acontecimento
mas quando acontece
é festa no outro apartamento

sentado aqui
já não sei quando tempo
sua espera
e uma divisão do sofá

toco com o olho
o telefone
em suspenso
alguns milímetros
mais próximos, nós dois

e lá no fundo
como barulho do mar
o som da solidão
encostada na varanda

(assoviando
pelas persianas
das venezianas)

e tudo que eu posso te dar é solidão com vista pro mar

enquanto espero
de lá pra cá
pela cidade
seguindo a rota de cada dia
olhando pra baixo
pelo afeto que tenho pelos buracos da calçada
e do asfalto
e essas poças de lama
e panfletos amassados jogados ao chão

todos ali
pro que der e vier
sempre

pendulando
como o ventilador branco de teto
que tem de fundo a parede branca
e é meu relógio
e roda sem parar
projetando sombras na parede vazia
e entre quartos
e entre salas
mesmo ao apertar do interruptor
ainda girando e girando devagar
lances de luz de claro e penumbra no claro do branco
deslizando

pelo apartamento

terça-feira, janeiro 30, 2007

like a feather (you and me)

como uma pluma
envolta em ar e em si
e sem roçar, paira

isadora


o véu mais voa do que veste
a pele é uma penugem que se curva
e esses pés que partem e pousam
num ritmo de pássaro em cada pulso...





*Espetáculo em homenagem à bailadora Isadora Duncan
http://www.youtube.com/watch?v=zRaKB7n7XmM - parte 1
http://www.youtube.com/watch?v=jvy-p4ljISU&mode=related&search= - parte 2

vi pétalas mas pensei plumas

e daí,
se as pétalas também já não voam
fora das flores
assim como as penas.

a não ser nas tuas mãos.

sexta-feira, janeiro 26, 2007

abençoada seja a solidão

para que possam existir esses espaços
como num átimo em que tudo é excesso
e de repente não falta nada
nem privacidade

porque o contato com o outro
não é mais contato
é ínfimo, é mínimo
é todo

num existir junto sem fazer barulho
em que não há sequer necessidade
de dizer tudo bem
e uma exclamação lá no fundo
de que se pode viver sem
porque já não seria possível nos separarmos

terça-feira, janeiro 09, 2007

Retratos

E de repente olhou
e realmente não era

Os retratos todos enfileirados dispostos com certa disciplicência pela parede alta e ampla do cômodo de estudos. Dos mais variados tipos e tamanhos, passeando de Rembrandt a Edward Hopper, todos quadros que lhe pintara. Tantos quadros que talvez deixassem qualquer um tonto. Mas não era esse o motivo pelo qual se encontrava agora trôpega: era pela descoberta.

Descoberta não, se recompôs, constatação. Constatação porque estavam ali o tempo todo, e ao mesmo tempo não era exatamente agora que notara... Há muito já havia percebido, aliás, desde o começo, perceberá mas não entendera, ou não quisera. Tão talentoso. Mas agora sim. Sem esforço nenhum e com total surpresa, entendera. Todos aqueles retratos ali, pela parede, seus retratos que adorava tanto, cada um uma lembrança... não eram realmente ela. Não era.

E foi nesse instante que sentiu tudo girar, e ela realmente girava, os olhos trôpegos cavalgando de quadro a quadro; não pelos próximos de um a um, mas aos pulos, de cima à baixo, diagonal e por todos os lados. Queria abarcar logo todos, e o fazia com fúria de ansiedade. Em algum deles deveria estar a chave para decifrar aquele mistério.

E de repente naquela busca se deparava novamente com sua imagem, parecia realmente ela. E não era. Tão parecida mas faltava alguma coisa, detalhe ínfimo que fosse. O detalhe existia, aliás, pensou, e era outra.

Não burra, não era tonta, como poderia não ter percebido por tantos e tantos retratos recebidos? Quadro à quadro os revisava, se reconhecia e estranhava. Aquela feição não era a sua, talvez o rosto sim, as bochechas rosadas e meio cheias, os cabelos bem lisos escorrendo aos lados do rosto, os olhos pequenos e ligeiramente fechados. Mas aquele sorriso lívido, aquela melancolia leve, com certeza não eram dela. Importara de outro alguém.
Mas ora, que besteira, não seria possível retratação tão fiel que não deixasse imperfeição. Mas não era questão de incoerência, sentiu, nem defeito. O que estava ali estava com perfeição e se não era ela, era outra. Ou outro.
Tudo lá, tão perfeito, começando pelo nariz, tão reto, pequeno, comum... tão comum que poderia ser o de qualquer pessoa. Talvez fosse isso, o nariz. Por aquele nariz se escapava o retrato de si. Qualquer um poderia caber naquele retrato, entrando pelo nariz.
Paranóia? Se fosse não se questionaria, como era possível, uma simples... Sou eu, é claro, que tolice. Bem se vê que houve esforço. Ora, que tola. Deselegância... Inveja, talvez. E agora via que tola era ela. Só quando sozinha e distraída o suficiente olhara de relance a parede e começou a pensar... E se... Mas como? E de repente já era tão certo e agora tão óbvio, mas não fazia o menor sentido. Talvez falta de habilidade... Não, não poderia, pois ao deixar de se reconhecer agora reconhecia outra coisa, que não sabia o quê, mas não ela.

E ela que sempre sentira aqueles quadros tão deles, presente por presente, o jeito dele de ver o mundo e não só isso, a maneira como gostaria de sê-lo, e lhe pintara assim. O que havia de errado não sabia ainda diagnosticar, mas sabia. Talvez um glamour ou mesmo um peso que não era dela, mas bem que gostaria. E os quadros, sempre notara, cada um mais diferente que o outro, mais lívida, impressionista, romântica, fugaz, linda. Às vezes desenhos rápidos feitos à lápis e papel numa tarde na casa de amigos ou piquenique; estes menos parecidos, mas enquadrados e guardados com tanto carinho.
Quem sabe mais relaxado ou em intimidade comigo, entre momentos de gozo, ele deixasse escapar esse outro, esse outro que parece desejar tanto quanto a mim. Agora tinha certeza, era outro, e não outra; era homem e lhe olhava. E de repente se assustou, e tapou a boca e caiu. Caiu desengonçada, mas leve, dobrada sobre os próprios joelhos. passou a mão sobre a testa, era frio e pensou, mas já sem nenhuma ansiedade.

E ao deixar de mirar a vertigem da parede, as coisas começaram a fazer mais sentido. Pensou em como vez por outra achara que superestimara a sua habilidade, em um prenúncio de estranhamento dentro da imensa alegria de recebê-los. Mas preferira acreditar que eram a maneira como lhe via, e por muito não pensava nisso. Talvez falta de habilidade, mas isso não suportava. Se tentava há pouco acreditar que sim, agora sabia que não, habilidade não faltava, e estava claro. Provavelmente não pra ele, mas pra ela, tinha certeza e via agora: era outro.

Jordana,

















num íntimo
num átimo
na inflexão exata
no momento da bala
que disparada
atinge o seu máximo

o momento em que, como bala,
não é eminência nem alojada
na distância exata
entre intencional e deflagrada
o momento em que oscila
entre fuga e amendrotada
o momento em que é só ameaça



*na foto, retrato de jordana vieira, aluna de balé da Vila Olímpica da Maré selecionada,entre mais de mais de 20 mil concorrentes a uma vaga no mundialmente famoso balé Bolschoi.
créditos: marcelo carnaval para a sessão retratos capitais.

terça-feira, janeiro 02, 2007

Bem doida!

Ela faz versos como quem respira,
Fala como quem recita;
Escreve num pulso que é tão in
Que in pulsa

É música como que num riso
Num ritmo trôpego, bêbado
De si, cada vez mais
E mais e mais a cada instante
De vida, embriagada

Ela fala como quem recita,
E é, como quem respira
Mais vida, mais louca
Bem doida!

Feito música... Ressoa.


o céu é azul
tenho os pés no chão
e amo você