sábado, abril 12, 2008

Poema para uma mosca morta












Vendo a mosca morta assim
Estatelada
Morta mesmo
Sobre a fórmica branca
Limpinha
Patas pra cima
Olhos estáticos
Asinhas coladas ao chão
Pobrezinha
Me vem até certa comoção

Mas isso vendo-lhe assim,
Tão pequenina
Mas imaculada
Sem destroço
Nem nada
As duas asinhas meio tortas
Mas ainda coladas ao corpo
Caso contrário,
Sentiria só nojo

Percebo, assim
Que a cota
Do que me toca
É como você,
Pequenina

Morta assim
Inteirinha
Sem asa pra um lado
Nem sangue espalhado
Consegues pousar leve
Sobre a minha consciência
E se instalar
Nessa superfície branca
E insípida

Constato
Não sem horror,
Mas com certa alegria,
Que o meu estômago
E simpatia
Só respondem a uma certa quantia
De carne e de osso
Ou parentesco
Na escala evolutiva


Um bom exemplo,
A foto do elefante morto
Congelado, nas geleiras do Himalaia
Mesmo encontrado inteiro
Imaculado
Faltando na verdade somente a ponta do rabo
Isso sim
Me ojeriza
E tomba
Sobre a minha espinha

7 comentários:

Anônimo disse...

medo tenho eu, dela, por me enxergar bem mais.

Thalita Castello Branco Fontenele disse...

!

Antes um peso congelado e liso
a uma leveza morna e áspera.

Débora Medeiros disse...

Parece uma coisa que vi num seriado. Tavam investigando o assassinato de uma garotinha e um dos policiais diz: "É uma pena, como alguém consegue machucar uma garotinha tão linda?". EAO que sua colega responde: "Se ela fosse feia, não seria uma pena, então?"

Às vezes, até a piedade é estética...

Mayara Carol Araujo disse...

Parece o enterro de qualquer pessoa. Morta, fria e maquiada, sempre foi santa, pessoa boa. Viva, as moscas, certas vezes, nos tiram do sério, são piores inimigos.

Engraçado isso.
(engraçado nada, né?)



Bom passear por aqui de novo.

Maré disse...

texto desconcertante.
arrepiante.
bom demais!

Susete Evaristo disse...

Olá bruno cheguei ao teu blog pesquisando um poema que falasse de uma mosca morta, porém não resisti a ver todo o teu blogue que confesso me agradou e vou voltar a visitar.
Agora gostava de te pedir autorização para copiar este teu poema.
Se não te importares responde-me para sgse.01@sapo.pt
Um abraço deste lado do Atlantico ou seja de Portugal

Susete Evaristo disse...

Obrigada foi muita gentileza da sua parte.
E claro que vou identificar o autor remeter para o seu blogue.
Um abraço