sábado, agosto 09, 2008

Gato









barulho de patas
acolchoadas
peso macio
nas costas
garras me alisam
pelos me percorrem
a espinha

corpo intangível
somes na casa
mas teu sorriso
invisível
por todo lado

te acho
dormindo na cama
embaixo
tua coluna ondula
no decorrer do meu tato

com a ponta dos dedos
agarro a tua falta
rastros de pêlo
e um miado

eu roço
o vazio
arranho
o espaço
entre a tua presença
e a ponta do rabo

da tua presença
somente a falta
e uma lembrança
que dura
no meu braço
a tua garra

sábado, agosto 02, 2008

Aos poucos

Abrir os olhos. Virar o rosto no travesseiro. Ficar de lado. Levantar rápido, desligar o despertador, espreguiçar. Dormir mais um pouco.

Deslizar a cabeça sobre os lençóis. Acordar de novo. Sentar na beirada da cama. Ir ao banheiro. Enxaguar a boca, escovar os dentes, fazer xixi. Sentado.

Voltar à pia, escovar os dentes, sem pasta: tirar o acre da boca. Ir tomar café.

Desistir. Tomar somente água. Quem sabe um leite com açucar.

Sentar de frente à TV. Reunir forças. Pensar no que se tem a fazer. Deitar no sofá. Ver programas de TV. De culinária. Sentir um pouco de fome, esperar o almoço. Comer pouco.

Sentar em frente ao pc. Ver algumas notícias. Evitar os e-mails mais sérios. Começar a se arrumar na hora em que deveria estar saindo de casa. Sair de casa na hora em que deveria estar chegando lá.

Andar pululando de calçada em calçada, buscando as sombras. Se encostar atrás da parada, pensar um pouco. Se erguer impaciente, o ônibus chegando. Não ser a linha correta. Esperar o outro. O outro. E o outro. Enfim.

O sol no rosto. Sentar-se no lado da sombra, um desejo. Não haver vaga. Ir em pé. Chegar meio vivo. Seguir a pé. Atravessar a rua. Fazer as coisas. Sutilmente. Todas as coisas. De cada vez.

Se aos 15 eu achava que iria ir morrendo, aos poucos, hoje eu vejo que não, que eu vou vivendo, que eu venho vivendo. Aos poucos.